Imaginem se...
- tmpego
- 8 de mar. de 2021
- 4 min de leitura

Imaginem se as escolas fossem lugares onde a natureza fosse o nosso chão para aprender e em que as culturas e tradições do nosso povo e dos povos existentes no mundo fossem inspiração para a criação permanente. Imaginem se fosse possível inspirarmo-nos no passado e agir no presente, sem qualquer tipo de julgamento, dizendo que o que se faz agora é uma mera cópia de algo feito no passado. Talvez seja exagerado dizer que tudo aquilo que se faz agora é sempre cópia de algo do passado, pois isso implicaria que soubéssemos absolutamente tudo o que se realizou no mundo.
Ontem, assisti a uma conferência que homenageava um homem que conheci há alguns anos, através dos seus escritos e palestras. Julgo ter sido em 2010. A pessoa de que falo chama-se Ken Robinson e faleceu em agosto do ano passado. Ken Robinson era um escritor, comunicador inglês, professor, que refletiu bastante sobre a criatividade no ser humano, as metodologias pedagógicas, sobre a relevância de todas as áreas de conhecimento para o desenvolvimento integral do ser humano, a partir do momento em que inicia a aventura da aprendizagem. Este autor referia que os sistemas educativos estavam obsoletos, havendo a urgência de uma profunda reflexão por forma a que se repensasse o sistema e se procurasse ir ao encontro de uma aprendizagem mais significativa e cooperativa, valorizando a criatividade.
Foi em várias TED talks de Ken Robinson que fiquei a compreender a evolução da educação, o papel das artes, da criatividade e da imaginação para liberar todo o potencial do indivíduo. Apreendi ainda a importância de compreender o nosso mundo interior, a exploração do lado lúdico, a experimentação, a conexão com a natureza, e a criatividade (se queremos pintar uma maçã de cor azul, por que razão não o podemos fazer – se assim a imaginamos e se gostamos da cor?). E, como dizia Miguel Cervantes "Quando se sonha sozinho é apenas um sonho. Quando sonhamos juntos é o começo da realidade”, sendo que podemos sonhar esta mudança, mas para agir é preciso mais do que um. Foi através da leitura dos livros “O Elemento” e “Out of our minds” que comecei a compreender que cada um de nós se pode transformar, sendo perseverante na sua forma de estar no mundo, pelejando por aquilo em que acredita. Porque, na verdade, ao entusiasmar-se poderá contagiar os outros. Imaginem se este fosse o vírus e se este se tornasse profundamente pandémico. Pergunto-me qual seria a partir daí o caminho do nosso mundo.
Nesta conferência chamada “Imagine if”, organizada por Kate Robinson, filha de Ken Robinson, os intervenientes reforçaram que as técnicas que cada um usa adequam-se a uma pessoa, a um grupo de pessoas num determinado momento. O facto de a pessoa usar uma técnica num dia não significa que possa resultar nos outros dias. Para além de que pode não resultar com outra pessoa ou outros grupos de pessoas. E as técnicas de um podem não ser as técnicas de outros, porque cada um é único, tem a sua forma de estar e o seu universo de experiências. Um grupo de pessoas pode partilhar as mesmas perspetivas, a mesma filosofia, acreditar em algo, mas a forma como o vamos transmitir a outra pessoa ou a um grupo de pessoas será com certeza diferente.
E com esta conferência, e relembrando os livros e as palestras que Ken Robinson realizou ao longo da sua vida, reforcei a ideia de que realmente a valorização das pequenas coisas é de louvar, celebrar os passos que se vão dando, entusiasmando-nos em conjunto com esse que os dá. Penso que este autor vincou sempre a ideia de que cada um de nós tem o seu tesouro, que cada um de nós sentirá um apelo por um determinado caminho, mas só o irá fazer se o ambiente onde estiver envolvido o propiciar. Caso contrário, provavelmente irá definhar, tal como a planta que não está no solo certo para poder medrar. Daí a relevância da família e dos espaços educacionais. Não é a padronização e a massificação que dita o que é correto ou não, mas o caminho único que cada um percorre ao longo da sua vida, e os vestígios que deixa em cada espaço e nos outros seres com que se vai cruzando.
Imaginem se na escola se trabalhasse o todo e se desse as ferramentas para que cada pessoa as usasse no sentido de procurar aquilo que pretendia desenvolver. E mesmo que essa pessoa tivesse algum receio e se sentisse perdida, aperceber-se-ia do apoio de pessoas para o ajudarem a medrar, sem estarem preocupadas com o tempo e com um sistema de avaliação que posiciona os indivíduos em caixas e os hierarquiza, sublinhando a importância da competição. Imaginem se nestes espaços de aprendizagem verdadeiramente significativa, cada ser humano se pudesse desenvolver ao seu ritmo, em relação próxima com a natureza, uma dança constante, tendo consciência de que faz parte desse todo que vai aprender a respeitar. Imaginem se cada um traçasse o seu caminho, tendo a consciência de si e dos seres com os quais coabita, respeitando-os profundamente, indo ao encontro dos sonhos que delineou, sem que nenhuma entidade ditasse objetivos, como sendo os necessários para se atingir um perfil excelente que encaixasse numa sociedade com um desenho próprio. Imaginem se todos nós olhássemos para o que estamos a fazer, como sendo algo que realmente queremos e em que acreditamos e não porque alguém nos diz que é importante ou que vale isto ou aquilo, segundo uns padrões ditados por alguém numa determinada sociedade. Imaginem se nós nos cumpríssemos, tal como refere Agostinho da Silva, tendo consciência de que realmente somos um poeta à solta, um poeta com raízes, ou seja, com consciência de si e do caminho que percorre e o faz porque acredita nele, porque o quer realizar, e não porque alguém diz que deve ser assim, satisfazendo interesses de terceiros. E se o mundo fosse um local a albergar seres em relação simbiótica, a cooperar mais uns com os outros, entreajudando-se mutuamente no crescimento?
Imaginem se…
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