O Lugar de Encontro – o que é?
- tmpego
- 11 de fev. de 2021
- 4 min de leitura

A importância de um espaço de segurança para a reflexão livre
Na criação do lugar de encontro e de espaços para conversar sobre aspetos da vida e interligar tudo de forma fluida com conhecimentos mais técnicos, é curioso notar que neste espaço aberto de conversação, mesmo pegando em conteúdos que estão presentes nos referenciais e conteúdos programáticos escolares, a certa altura começa a florescer dentro de cada participante uma consciência de familiaridade no espaço, uma liberdade que se pauta pelo respeito e pela noção da existência do espaço individual e também do espaço comum. E assim surgem questões espontâneas, ou seja, quem não estava muito habituado a perguntar, de repente, apercebe-se ali de um lugar aberto e seguro para questionar, porque tem curiosidade e deseja conversar sobre os assuntos, sem estar a impor nenhum tipo de mensagem, nem nenhum tipo de crítica ou julgamento. Aos poucos, a aprendizagem vai acontecendo como um rio que flui, num ambiente amigável, onde se sente confiança entre os presentes e onde se tem vontade de conhecer e partilhar.
E é desta maneira que estes espaços de segurança, ou melhor, lugares de encontro, surgem. Na verdade, é como a natureza. Os lugares surgem como a vegetação que vai crescendo, de forma orgânica, com uma desorganização aparente, mas com uma sólida base por detrás, algo que a sustenta e a faz expandir e evoluir. Na visibilidade podemos ver raízes entrelaçadas por cima de arbustos, de flores, sugerindo um ambiente silvestre, sem arrumação, mas escondendo o meticuloso sistema de comunicação na invisibilidade que permite a todos os elementos naturais respirarem e terem, cada um deles, o seu espaço.
Por vezes, sinto resistência em aceitarem novos espaços e práticas diferentes, o que é perfeitamente natural, já que estiveram muitos anos habituados a um sistema e forma de estruturação de ensino que agora é difícil desconstruir. Quando algo é repetido durante uma larga temporada, depois a adaptabilidade a novos hábitos torna-se mais árdua, levando a que muitas vezes anseiem por sistemas antigos em que a informação é veiculada por uma pessoa, o professor ou o formador, e o seu papel se resuma pura e simplesmente a recetor quase passivo da informação. Como os extensos conteúdos dos referenciais e dos programas precisam de ser ministrados na totalidade durante um ano letivo, a tarefa de apresentar caminhos para os alcançar torna-se também um desafio considerável.
Criando estes lugares de encontro, promovendo um ambiente favorável à partilha e à expressão de cada um, toda a aprendizagem será mais profunda, porque vivenciada na pele. Arno Stern criou o conceito de “clos lieu”, um lugar onde as crianças que vinham para o seu ateliê podiam expressar-se através da pintura livre, local onde a criança, como diz Arno Stern, “sabe que não será perturbada, nem distraída, nem interrogada pelos curiosos, que querem que se explique tudo o que se faz e até mesmo antes de se fazer. Aqui a criança aprende a não perturbar o trabalho de cada um, respeitando-o e evitando qualquer tipo de confusão.” Arno Stern considera que podem existir lugares que favoreçam precisamente o reencontro que as pessoas têm consigo mesmas, tal como o recolhimento a casa e ao quarto, à noite, depois de mais um dia de trabalho, por forma a silenciar e reequilibrar.
E como criar este lugar?
A criação destes lugares de encontro, tal como disse anteriormente, pressupõe calma e, acima de tudo, escuta. Não é de repente que se constrói este ambiente de aceitação da diferença do outro, das suas vulnerabilidades, das suas ideias, em suma, do seu ser. Tudo isto requer espaço dentro de nós, calma, criatividade que vai para além do seguimento de uma listagem de pontos que se encontram estruturados nos conteúdos programáticos; assenta também na arte de escutar o outro, de o convidar para uma partilha, sem estar a rotular de “certo” ou “errado”, mas simplesmente de estar disponível e presente para ouvir o outro falar dos seus interesses, daquilo que o move, o entusiasma, o inquieta. Uma das coisas que faço, por forma a melhor planear o trabalho, é ir anotando num caderno algumas das atividades que os formandos realizam nas suas vidas, alguns dos seus interesses, conseguindo criar pontos de encontro entre toda essa valiosa informação e os conteúdos listados nos programas. Partindo das suas vontades e interesses, sugerem-se atividades de grupo e trilhos para aprendizagens mais autónomas. Há sempre caminhos e pontes.
Há espaço para a arte neste lugar de encontro?
Depois deste ambiente seguro se começar a expandir naturalmente, a partilha entre todos vai surgindo de forma tranquila e sem pressas. Passado pouco tempo, a arte também se abraça a este lugar. Então, é possível, num contexto empresarial, vários colaboradores (que estão inscritos numa formação) com funções diferenciadas, unirem-se à volta de uma mesa a discutir sobre livros que leram na sua infância ou livros que estão a ler atualmente; é possível vê-los a expressarem-se à volta de um tampo de mesa envolvido em papel com guaches, pastel, colagens, recortes e lápis de cor. No início, pode haver ainda resquícios de silêncios envergonhados, sem saberem o que fazer ou ainda presos ao medo do julgamento mas, depois, aos poucos e poucos libertam-se e imergem, tal qual crianças, e desenham, ou seja, mostram as memórias que neles habitam. Depois de uma manhã de trabalho minucioso num espaço fechado com máquinas e ruídos de toda a ordem, reencontram-se consigo próprios naquele silêncio conjunto. E assim se criam e reforçam laços, se respeitam espaços únicos de expressão.
Comments